"Quanto mais eu aprendo alemão, menos eu sei" é o que diz o jargão aí do título.
É uma incoerência, mas é que quanto mais eu aprendo, mais eu quero dar passos mais largos do que posso, mais eu exijo de mim, começo a querer beber de fontes as quais a minha compreensão linguística ainda não alcança e, então, a sensação é de que ainda sei pouco e preciso aprender mais. Acho que essa é a válvula propulsora da busca incessante do conhecimento. É o que faz com que o ser humano disciplinado, aberto a tudo que é novo ou desconhecido a si, que tenha iniciativa e disposição, siga o caminho do corajoso, visionário, inovador, desbravador, criador, descobridor e empreendedor. E aí é muita dor pra minha carriola e antes mesmo de começar, eu desisto. Em uma palavra só: preguiça.
Apesar de aberta ao novo e sedenta por saber, tenho medo do desconhecido, não sou disciplinada, não tenho iniciativa e muito menos disposição física ou mental. E então fico com a sensação constante de estar aquém, uma sensação de frustração e incapacidade; uma sensação de falta de vontade de vencer o vício do ócio intelectual, sentar a bunda na cadeira e, em vez de entrar no Facebook, entrar de cara nos livros. Como dizia meu pai, em seu linguajar de chão de fábrica, eu tenho medo de encarar o batente, pegar no basket, ter expediente.
Depois de 6 anos morando na Alemanha, meu alemão não passa do nível B1 e, paradoxalmente, tendo feito duas faculdades, exames de Cambridge do FCE ao CPE e além, dado cursos de inglês e de preparação aos exames de Cambridge e sendo examinadora dos mesmos, me vi avessa a fazer exames da língua alemã. Sou uma mulher sem nível. Estou perdendo meu inglês, meu alemão melhora a passos de lesma, meu português está ficando capenga, mas pelo menos ainda divido a cama com o meu brasileiro.
Agora, o mais incoerente ( ou talvez não, se for analisado pelo aspecto neurolinguistico) é que começo a misturar o inglês com o alemão mesmo sabendo menos da segunda língua e aí vira uma lambança. Ontem, por exemplo, a mãe de uma amiguinha da Lara veio devolver a Lara depois de um play date. Ela fala inglês fluentemente, mas eu tento falar alemão até onde posso, quando não dá mais, parto para o inglês e vou abusando do Denglisch. Aí, falando dos quadros que eu comprei no eBay, eu disse:
- The painter is from Halle. I bought fünf on eBay. He had one in orange auch gemacht.
Ela começou a rir, pois ela entendeu tudo mas achou interessante a mistureba que eu fiz. E disse que meu alemão está melhorando tanto que até quando eu fala inglês, eu falo alemão. Pra estar falando assim, já devo estar na TPM.
A mesma coisa acontece quando eu começo uma conversa com um desconhecido e quando meu alemão não dá mais eu pergunto: "Sprechen Sie Englisch, bitte?" E a pessoa responde: - "Ein bisschen (um pouco)"- o que normalmente quer dizer "muito melhor do que o seu alemão". E eu, em vez de partir pro inglês, continuo falando em alemão. Outro ponto que pode ser explicado pela neurolinguística.
Comodismo ou comodidade?
Viemos para cá sem família a tiracolo, com uma bebê de sete meses nos braços e com a tarefa de nos adaptarmos a um país ocidental mas bem diferente do nosso país tropical. Houve algumas renúncias para que isso acontecesse, entre elas, abrir mão da minha profissão e ficar longe da família. Mas, por outro lado, poderia viver em um país de primeiro mundo e me dedicar 100% à criação da minha filha. Quem, por escolha, tem essa possibilidade no Brasil? Sabíamos que a língua alemã e o frio seriam duas barreiras grandes a serem transpostas, mas nada que nos fizesse desistir do sonho de morar na Zooropa.
Sendo Bonn ex-capital federal, tendo até a década de 90 milhares de estrangeiros que trabalhavam nas embaixadas e consulados, muita gente bem ou mal fala inglês. Portanto, se virar não seria e não é problema nenhum, mas mesmo assim, nem mesmo havíamos nos instalado na nossa casa e já me matriculara em um curso de alemão às 8 da noite, para que o Amanzor pudesse tomar conta da Lara. Foquei também minha atenção em tirar minha carteira de motorista.
Quando ainda no Brasil, a língua alemã nunca me chamou a atenção, nunca tive interesse em aprendê-la, e por ser professora, ao me deparar com o nível de ensino da língua aqui, nas escolas que frequentei (infelizmente, ainda não tive condições de pagar o prazer de conhecer o sistema do Goethe Institut), me desmotivei. Com professores mal preparados e didática zero, salvo raríssimas exceções, eu ficava divagando e analisando como aquela aula poderia ser dada. Daí, Amanzor viajava e eu perdia 4 aulas seguidas. Lara ficava doente, eu não podia estudar. Eu mesma ficava doente e não tinha ânimo e fui perdendo a vontade.
Hoje, com mais um filho, a dificuldade cresceu. Não temos o luxo de recorrer à família para cuidar de nossos filhos numa necessidade ou eventualidade. Conto sim com minhas amigas, que também tem suas dificuldades por estes lados, pois muitas estão em situação semelhante. E a prioridade é o trabalho do Amanzor e suas viagens e horas extras. Sem isso, não estariamos por estas bandas.
Portanto, não falar fluentemente o alemão, estando aqui há tanto tempo, tem tudo a ver com a nossa história, as oportunidades que tivemos ou não, as dificuldades que passamos no dia a dia e escolhas que fizemos e fazemos. E pensando por esse lado, não tem nada a ver com comodismo, mas com a comodidade de poder abrir mão de determinadas coisas por outras que no momento são mais importantes.
PS: Vale ressaltar que pra escrever este como tantos posts nos blogs levei várias horas, parando pra ver uma coisa aqui outra ali, sem a devida concentração que requer os estudos ou a leitura de um livro. E pra saber se o título deste post estava correto, recorri a uma menina de sete anos, então, alguma coisa está valendo a pena.