quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Je mehr ich Deutsch lerne, desto weniger weiss ich

"Quanto mais eu aprendo alemão, menos eu sei" é o que diz o jargão aí do título. 
É uma incoerência,  mas é que quanto mais eu aprendo, mais eu quero dar passos mais largos do que posso, mais eu exijo de mim, começo a querer beber de fontes as quais a minha compreensão linguística ainda não alcança e, então, a sensação é de que ainda sei pouco e preciso aprender mais. Acho que essa é a válvula propulsora da busca incessante do conhecimento. É o que faz com que o ser humano disciplinado, aberto a tudo que é novo ou desconhecido a si, que tenha iniciativa e disposição, siga o caminho do corajoso, visionário, inovador, desbravador, criador, descobridor e empreendedor. E aí é muita dor pra minha carriola e antes mesmo de começar, eu desisto. Em uma palavra só: preguiça.
Apesar de aberta ao novo e sedenta por saber, tenho medo do desconhecido, não sou disciplinada, não tenho iniciativa e muito menos disposição física ou mental.  E então fico com a sensação constante de estar aquém, uma sensação de frustração e incapacidade; uma sensação de falta de vontade de vencer o vício do ócio intelectual, sentar a bunda na cadeira e, em vez de entrar  no Facebook,  entrar de cara nos livros. Como dizia meu pai, em seu linguajar de chão de fábrica, eu tenho medo de encarar o batente, pegar no basket, ter expediente.
 Depois de 6 anos morando na Alemanha, meu alemão não passa do nível B1 e, paradoxalmente, tendo feito duas faculdades, exames de Cambridge do FCE ao CPE e além, dado cursos de inglês e de preparação aos exames de Cambridge e sendo examinadora dos mesmos,  me vi avessa a fazer exames da língua alemã. Sou uma mulher sem nível. Estou perdendo meu inglês, meu alemão melhora a passos de lesma, meu português está ficando capenga, mas pelo menos ainda divido a cama com o meu brasileiro.
Agora, o mais incoerente ( ou talvez não, se for analisado pelo aspecto neurolinguistico) é que  começo a misturar o inglês com o alemão mesmo sabendo menos da segunda língua e  aí vira uma lambança. Ontem, por exemplo, a mãe de uma amiguinha da Lara veio devolver a Lara depois de um play date. Ela fala inglês fluentemente, mas eu tento falar alemão até onde posso, quando não dá mais, parto para o inglês e vou abusando do Denglisch. Aí, falando dos quadros que eu comprei no eBay, eu disse:
- The painter is from Halle.  I bought fünf on eBay. He had one in orange auch gemacht.
Ela começou a rir, pois ela entendeu tudo mas achou interessante a mistureba que eu fiz. E disse que meu alemão está melhorando tanto que até quando eu fala inglês, eu falo alemão. Pra estar falando assim, já devo estar na TPM.
A mesma coisa acontece quando eu começo uma conversa com um desconhecido e quando meu alemão não dá mais eu pergunto: "Sprechen Sie Englisch, bitte?" E a pessoa responde: - "Ein bisschen (um pouco)"- o que normalmente quer dizer "muito melhor do que o seu alemão". E eu, em vez de partir pro inglês, continuo falando em alemão. Outro ponto que pode ser explicado pela neurolinguística. 

Comodismo ou comodidade?

 Viemos para cá sem família a tiracolo, com uma bebê de sete meses nos braços e com a tarefa de nos adaptarmos a um país ocidental mas bem diferente do nosso país tropical. Houve algumas renúncias para que isso acontecesse, entre elas, abrir mão da minha profissão e ficar longe da família. Mas, por outro lado,  poderia viver em um país de primeiro mundo e me dedicar 100% à criação da minha filha.  Quem, por escolha, tem essa possibilidade no Brasil? Sabíamos que a língua alemã e o frio seriam duas barreiras grandes a serem transpostas, mas nada que nos fizesse desistir do sonho de morar na Zooropa.
Sendo Bonn ex-capital federal, tendo até a década de 90 milhares de estrangeiros que trabalhavam nas embaixadas e consulados, muita gente bem ou mal fala inglês. Portanto, se virar não seria e não é problema nenhum, mas mesmo assim, nem mesmo havíamos nos instalado na nossa casa e já me matriculara em um curso de alemão às 8 da noite, para que o Amanzor pudesse tomar conta da Lara. Foquei também minha atenção em tirar minha carteira de motorista. 
Quando ainda no Brasil, a língua alemã nunca me chamou a atenção, nunca tive interesse em aprendê-la,  e por ser professora, ao me deparar com o nível de ensino da língua aqui, nas escolas que frequentei (infelizmente, ainda não tive condições de pagar o prazer de conhecer o sistema do Goethe Institut), me desmotivei. Com professores mal preparados e didática zero, salvo raríssimas exceções, eu ficava divagando e analisando como aquela aula poderia ser dada. Daí, Amanzor viajava e eu perdia 4 aulas seguidas. Lara ficava doente, eu não podia estudar. Eu mesma ficava doente e não tinha ânimo e  fui perdendo a vontade. 
Hoje, com mais um filho, a dificuldade cresceu. Não temos o luxo de recorrer à família para cuidar de nossos filhos numa necessidade ou eventualidade. Conto sim com minhas amigas, que também tem suas dificuldades por estes lados, pois muitas estão em situação semelhante. E a prioridade é o trabalho do Amanzor e suas viagens e horas extras. Sem isso, não estariamos por estas bandas. 
Portanto, não falar fluentemente o alemão, estando aqui há tanto tempo, tem tudo a ver com a nossa história, as oportunidades que tivemos ou não, as dificuldades que passamos no dia a dia e escolhas que fizemos e fazemos. E pensando por esse lado, não tem nada a ver com comodismo, mas com a comodidade de poder abrir mão de determinadas coisas por outras que no momento são mais importantes.  

PS:  Vale ressaltar que pra escrever este como tantos posts nos blogs levei várias horas, parando pra ver uma coisa aqui outra ali, sem a devida concentração que requer os estudos ou a leitura de um livro. E pra saber se o título deste post estava correto, recorri a uma menina de sete anos, então, alguma coisa está valendo a pena.
 PS 2: Pra saber qual o seu nível de alemão: Deutsche Welle - Einstufungstest   
                                                                   Goethe Institut 

domingo, 5 de agosto de 2012

Meu pé esquerdo

Quebrei o pé e não me pergunte como. E de pé quebrado, sem o sabe-lo, fiz uma via sacra em busca de uma solução para a dor insuportável que foi minimizada pelos médicos que se pegam em sua ignorância: "Se não sei o que é, não é nada sério".
Comecei a sentir uma dorzinha chata no pé esquerdo numa segunda-feira, mais precisamente no dia 02 de julho. Não dei atenção, pois dores sem motivo são o que mais sinto, afinal, sou sedentária desde que nasci. Marido viajou na quarta-feira pra ficar a semana inteira fora, o que significa que minhas atividades rotineiras foram redobradas. Chegou a sexta-feira e não conseguia caminhar. O pé inchou e, no domingo, graças à pressão de uma amiga querida que se prontificou a ficar com os pimpolhos, fui ao hospital. Andei um tanto de onde consegui estacionar o carro até o pronto-socorro e ainda debaixo de chuva. Que dor miserável.
 A médica disse que, se não teve trauma, não tinha o que se fazer além de passar Voltaren e ir na segunda-feira a um ortopedista. Ela mesma, sabendo como é difícil conseguir uma consulta, sugeriu ir de sopetão, sem marcar, caso contrário, conseguiria uma consulta para daqui uns dois meses. Eu perguntei se o pé não poderia ter alguma fratura. Ela, então, me mandou pra Radiologia e, ao analisar o raio-X, disse que não tinha nada quebrado. Voltei para o carro com o pé enfaixado com compressa de Voltaren.
Na segunda-feira, pra não ir até o médico com duas crianças a tiracolo e ouvir que eu tinha que marcar consulta antes de aparecer no consultório, liguei e consegui uma consulta pra dois dias depois de chorar as pitangas. Mas eu não fui em um ortopedista, porque nunca fui paciente de um. Eu fui ao médico especialista em reabilitação que tratou um problema que tive no pescoço. Ele olhou, viu que o pé estava inchado e disse que eu provavelmente tinha osteoporose, artrose ou tendinite e me mandou fazer uma MRT - Magnetresonanztomographie = Ressonância Magnética (o outro nome desse exame é Kernspintomographie. Eu acho esse nome engraçado porque quando eu cheguei aqui eu não sabia dividir as palavras direito e lia Kerns- PINTO- mographie. MRT é mais fácil.). Andei um outro tanto até o consultório indicado pra fazer a MRT, com minha  outra amiga que, mesmo com uma bebezinha nos braços. se ofereceu pra me levar. Consulta mais próxima: 30 de julho = TRÊS SEMANAS DEPOIS. Eu disse que não tinha condições de esperar. Não teve jeito. Cheguei em casa, liguei para outras clínicas e todas as datas eram pra depois.  Uma delas era somente clínica particular. O exame custaria 250 euros e poderia ser feito no dia seguinte. Disse que iria pensar. Liguei para o plano de saúde e perguntei se eles reembolsariam. Nâo. Mas eu poderia ligar para uma central de marcação de consultas e eles poderia conseguir um data mais próxima. Liguei e depois de um interrogatório, a atendente, muito simpática, me disse que me daria um retorno no dia seguinte por volta das 12 horas, mas não garantiria uma consulta em menos de 4 dias, pois de acordo com a experiência dela, a data que eu tinha já estava bem próxima para este tipo de exame.
O dia seguinte era uma quinta-feira,  12 de julho. Amanzor retornou da viagem por volta das 9h30 da manhã e disse que eu deveria fazer o exame particular e não esperar uma consulta pra daqui a 4 dias. Liguei para outros lugares pra ver se conseguia um exame mais barato. Até na clinica da universidade o exame ficaria por 600, eu disse 600 euros!!! Liguei correndo para a clinica particular e perguntei se ainda poderia fazer o exame naquele dia. Venha às 11horas. Fui. Fiz o exame, depois passei com o médico radiologista pra ele me dar o diagnóstico. Era um médico com mais de 70 anos, que falava meio enrolado. Eu até tentei entender mas aí, saquei a minha pergunta :
-" Sprechen Sie Englisch, bitte? Ich kann nicht alles verstehen" (O senhor fala inglês? Eu não consigo entender tudo.).
- Por que? Eu entendo perfeitamente o seu alemão!.
- Mas eu não entendo tudo o que o senhor fala e o assunto é importante.
- De onde você vem? - falando em inglês.
- Do Brasil.
- Que cidade?
- São Paulo.
- Ah, é a maior cidade do Brasil, não é?
- Sim
- E quantos habitantes?
- Uns 17 milhões - chutei.
- E com as cidades em volta?
- Uns 23.
- Você conhece o Barrichelo?
- Conheço, mas não pessoalmente. Afinal, são 17 milhões.
- E onde você aprendeu a falar inglês tão bem?

Gente, e o tempo passando e eu com fome e família me esperando no restaurante do outro lado da rua.
Finalmente, ele me mostrou as telas com as "fotos" do meu pé e disse que eu tinha uma fratura no osso do peito do pé, correspondente ao terceiro dedo, chamada Fratura de Marcha, típica de soldados. Peguei o relatório e o CD com o exame, fui comer e depois fui ao médico que me encaminhou pro exame.
Cheguei lá a recepcionista disse que ele não podia atender. Eu disse que eu tinha uma fratura no pé. OK, então. O médico viu o exame e me perguntou por que eu não fiz onde ele tinha me encaminhado. Eu disse que tinha conseguido uma consulta pra só dali a três semanas.
- Voce não quis esperar?
- Eu não pude esperar. A dor está insuportável, então resolvi procurar outra clinica.
- Você conversou pessoalmente com o Dr. Drewes?
- Sim, foi ele que deu o diagnóstico.
- Mas você teve que pagar pelo exame!
- Sim.

Aí, ele fez uma cara de que eu sou molenga.

- Ainda bem que eu fiz o exame pois eu tenho uma fratura.

Ai, ele fez uma cara de surpreso. Olhou o exame e disse:

- Ah, então é por isso que você não aguenta a dor.

Dããã.

-Mas não tem nada que eu possa fazer sem um relatório. 

E o relatório na mesa dele. 

-Tá aqui, ó. 
-Ah, tá. Mas não há nada que eu possa fazer. Eu cuido só da reabilitação. Você tem que procurar um ortopedista, ou melhor, um cirurgião, porque provavelmente voce tera que operar.

- Que? - aí minhas pernas amoleceram.

- Eu só conheço o Dr. Eisenburger, aqui pertinho. Ainda bem que eu não te dei uma injeção ontem, senão teria sido pior.

Amanzor tinha voltado pra casa pra por o Ricardo pra dormir. Andei até o médico na esperança de conseguir uma consulta imediata. Já eram 15 horas. O médico atendia naquele dia das 15h as 16h. Cada horário maluco! Chorei com a recepcionista, mostrei o pé, disse que esperava o tanto que fosse necessário. OK. Esperei meia hora e fui atendida. Ele não tocou no meu pé, não achou necessário ver a MRT e  perguntou se eu praticava muito esporte.

- KKKKK. Muito pelo contrário, doutor. 
- Estranho, pois essa fratura é típica de quem faz esportes.

(Eu pensei, então, que eu poderia ter perdido a barriga sem fazer esportes em vez de ganhar uma fratura de esportista sem fazer esportes)


- Os Dres. X e Y disseram que é uma Marchfraktur.
- Não, não é.


Bom, ele é o cirurgião, então deve entender melhor do assunto. Ele decidiu que não era caso de cirurgia e que nem mesmo iria colocar gesso. Afinal, com duas crianças e nas férias, seria uma tortura. Receitou uma bota que demorou uma semana pra ficar pronta depois de um atendimento miserável pela loja de produtos ortopédicos: cada funcionário com quem eu falava tinha um procedimento diferente. Quando cheguei em casa, depois dessa caminhada toda, tinha uma mensagem na secretária eletrônica, deixada pela moça da central de consultas, dizendo que ela conseguiu um local pra fazer o exame, pelo convênio, no dia seguinte!!!! Mas tudo bem, paguei pra ficar com a consciência traquila.
  Quando eu voltei ao médico no dia seguinte ao que peguei a bota, ele disse que a recuperação estava boa e que eu poderia andar com meu sapato normal mas com cautela e que em duas semanas eu estaria correndo. O pior foi que a minha amiga - a da bebezinha - foi me levar e ficou três horas me esperando ser atendida com a bebê a tiracolo e pra piorar, na saída do estacionamento, um degrau no chão comeu a lateral do carro dela. Além de pé quebrado, eu sou pé frio. 
Duas semanas se passaram quando eu, mais alegrinha com o fato de já poder caminhar sem tanta dificuldade, de repente, ao abrir a porta do meu guardaroupa, dei com ela exatamente no dedo correspondente ao osso fraturado. A dor foi tão acachapante que caí de costas na cama. O pé inchou de novo e acho que vai mais uma semana pra melhorar. 

Moral da (longa) estória:

Aqui também não é fácil ser atendido por médicos conveniados.
Pagando, você consegue consulta rapidinho.
É sempre bom buscar uma segunda (e até terceira) opinião.
Existem médicos que são alarmistas.
Existem, também, médicos que são simpáticos e otimistas.
A central de consultas realmente funciona. Pena que eu sou afobada.
Tem atendentes que são um porre, mas também tem as que dão um jeitinho.
Prestação de serviços, em lojas e consultórios, pode te dar uma bela dor de cabeça.
O que tá ruim pode ficar pior. 
Além de quebrado e frio, meu pé é feio.







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