sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Escola para a Lara

Assim que soubemos que íamos ficar por aqui, tivemos que começar a rearranjar algumas coisitas. A primeira e mais urgente: cancelar o cancelamento de contratos, que aqui deve ser feito com 3 meses de antecedência. A segunda, procurar hospital para o parto. E a terceira, pensar em uma escola primária para a Lara. Ã? Já? É já.
Ela só irá para a "Grundschule", escola de educação básica de primeira a quarta séries, em agosto de 2011, mas alemão gosta de planejar tudo com antecedência, o que não deixa de ser uma boa pra evitar percalços, mas que dá abertura para decisões indevidas, pois muita coisa pode mudar em um ano. Mas em terra de sapo, de cócoras com eles. Pra nos ajudar a decidir, no final de setembro e começo de outubro, acontece a "Tag der offenen Tür", o dia em que as escolas abrem suas portas para os pais interessados em conhecê-la. Neste dia, pode-se assistir às aulas e tirar dúvidas com os funcionários. Mas não dá pra escolher a escola ao seu bel prazer. Existem regras.
Em outubro você recebe um papel cor de rosa com o nome de três escolas supostamente próximas a sua casa - uma da prefeitura, uma católica e uma evangélica (na minha lista, essa última fica onde judas perdeu as meias) . Você tem direito à vaga em uma delas. Você pode tentar concorrer a uma vaga em outra escola que não esteja na lista. Mas no caso de não conseguir a vaga, a criança irá para uma das três escolas da sua lista onde ainda tem, que não necessariamente é a que você teria escolhido. Portanto, decidimos pegar o caminho mais seguro e optamos por uma das escolas que está na nossa lista. Ela é a mais próxima aqui de casa e já ouvimos falar de tudo sobre ela.
O meu bairro tem uma grande população árabe, turca, muçulmana. Considera-se que esse povo, grupo étnico, cultura (não sei como chamá-los) não se integra, não aprende a língua alemã e, portanto, tende a se manter numa linha abaixo do esperado no que se refere a participação ativa na sociedade alemã. Tentando reverter este quadro, esta escola tem um sistema especial de integração, inclusive com aulas de árabe e islamismo. Basicamente, essa é a crítica que fazem à escola; mais de 50% da população escolar é de origem estrangeira, predominantemente muçulmana e turca. Até aí, qual o problema? Nós somos estrangeiros também e quanto ao risco terrorista, ninguém é tão burro ao ponto de cuspir no prato que come (espero).
Por outro lado, no dia da visita à escola, encontramos um colega de trabalho do Amanzor que iria pleitear uma vaga lá, apesar da escola não fazer parte da sua lista. O motivo alegado  por ele é que a escola tem apoio de grandes empresas como Siemens e Bosch para a doação de computadores e montagem de laboratório. Além disso, a escola faz parte de um programa da prefeitura em que toda criança recebe por dia uma fruta. Vale lembrar que aqui não tem merenda escolar nem cantina. Tem que levar de casa. A criança que fica na escola além do horário de aula tem que ser registrada no programa de almoço e atividades extracurriculares e pagar à parte pra isso. Mas não tem vaga pra todo mundo. Outro ponto a favor da escola é que ela foi totalmente renovada há alguns anos e me pareceu bem estruturada. Além disso, foi a única onde, tão logo chegamos, fomos recebidos pela diretora que fez questão de nos explicar a estrutura, nos levou até a secretaria, nos deu as papeladas para registro e de quebra deu um regalo pra Lara. Na sala de aula, foi também o único lugar onde a professora veio falar com a Lara e perguntar se ela queria participar da atividade.

Por que uma escola pública?

Optamos por colocar a Lara em uma escola pública alemã, devido à impossibilidade de se pagar uma escola particular - que normalmente custa entre 1000 e 1500 euros por mês - e porque elas são geralmente escolas internacionais e nós queremos que a Lara se integre na cultura alemã. Dentre as opções que nos foram dadas, tinha a escola que escolhemos, a escola para onde a maioria dos amiguinhos da Lara vai por ficar próxima ao Kindergarten e a evangélica, que fica na PQP. Esta última, inviável. Se fossemos pensar na questão de socialização da Lara, a segunda ficaria mais fácil para ela. À primeira vista, ela  pareceu até passável, mas assim que passei a observar mais atentamente, me senti como teletransportada para a escola estadual onde estudei no meu bairro quando era criança: banheiros com obscenidades escritas nas paredes e prédios mal cuidados ( no site, ela parece ótima). Nos restou então a primeira, que dá pra ir a pé.
Agora, vamos ter que nos adaptar e aceitar uma coisa que a princípio dá frio na espinha. Não existem portões nem grades em torno das escolas e, nas que existem, eles ficam abertos o tempo todo. Era assim no meu tempo de escola, mas hoje quando visito meu bairro em São Bernardo do Campo, todas as escolas estaduais/municipais tem grades nas janelas e portas. Talvez a Alemanha também precise de uns 30 anos para transformar suas unidades escolares em prisões. Outra coisa que é natural é deixar as crianças de seis, sete anos irem sozinhas para a escola. Isso eu também fazia há 35 anos (tô véia). Talvez os pais alemães também precisem de 30 anos para perceber que o perigo que ronda as ruas é atemporal e  inerente à raça humana. Onde tem gente, tem gente mal intencionada e mentalmente doente. Eu é que não deixo minha filha ir sozinha para a escola. Integração e adaptação à cultura do país onde se vive tem seus limites. Que o digam minhas raízes brasileiras.

2 comentários:

  1. Otimo texto, pelo que li realmente fizeram a melhor escolha! Bjus e bom final de semana!

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  2. Que da hora! Eu também concordo em leva-la pra escola.
    Conte curiosidades! Eu adoraria saber diferenças mínimas sobre o sistemas educacionais de Brasil e Alemanha. Quem sabe a gente aprende a fazer, ou a evitar.

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