segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Cinquenta jeitos sem graça de dizer a mesma coisa

Dificilmente sou levada por febres de consumo, mas, passeando por uma livraria linda no centro de Bonn (www.thalia.de) , acabei cedendo à vontade de comprar um livro que está na moda e na boca da mídia e dos blogs femininos: "Cinquenta tons de cinza" - Fifty Shades of Grey -  de E.L.James, que, como eu, é mulher, mãe, e dona-de-casa. Cada exemplar da trilogia custava 9,90 euros. A trilogia inteira saia por 21 euros. Como não me deixo levar por febres de consumo mas sou facilmente dobrada por um descontinho, comprei a trilogia.
Vou ser sincera, foi difícil passar dos primeiros capítulos do primeiro livro. Como minha mãe me ensinou a comer pra não perder o vintém, li o primeiro livro forçada. Como nada aconteceu, além de sexo meia boca, eu comecei a ler o segundo pra ver se a coisa ia mudar ou continuaria no mesmo marasmo. Doce ilusão. Nem cheguei na metade do segundo livro e ele já está depositado  na pilha das revistas semanais ao lado da privada. Ou seja, só o leio quando esqueço algo melhor pra ler no banheiro. Tá,tá, eu sei que não é bom ler sentado na privada pois causa varizes, mas é só eu começar a ler o livro que eu tenho vontade de sair dali rapidinho de tanto tédio.
Uma coisa eu admiro na autora e não no livro: a sua capacidade de conseguir encher tanta linguiça dizendo as mesmas coisas de maneiras iguais, ou levemente diferentes, tantas vezes e assim mesmo ser capaz de fazer dinheiro. Talvez aí entre a capacidade dos marketeiros da editora que a contratou. Mas eu, formada em jornalismo e letras e dona-de-casa, posso afirmar que a linguagem que ela utiliza me faz brochar em vez de atiçar o fogo da minha "deusa interior". Gente, convenhamos, ela chama a diabinha sacana dela de "Inner Goddess", vai ser brega lá onde  o Christian perdeu as cuecas! Mas sabendo que o pseudônimo dela quando iniciou a carreira de escritora era " Snowqueens Icedragon", não dá pra esperar outra coisa. Eu imagino que os tradutores responsáveis pelas versões dos livros em outras línguas devem ter tido uma dificuldade tremenda pra versão não ficar tão ridícula quanto o original.
No alto de meus 44 anos, com dois filhos pra cuidar, fico pensando o que tem feito tanta gente/casal ver no livro um novo "Kama Sutra". Abaixo, minhas, repito, MINHAS considerações pra achar o livro um pé no saco (ou , mais na versão do livro, um breguetinho prateado em formato de bolas no fiofó):


  • Muito longo pra pouco conteúdo. Sinceramente, três livros com  maomeno 500 páginas pra falar a mesma coisa, capítulo após capitulo, que porra...
  • A linguagem na maioria das vezes não combina com a situação: " my post coital glow" pra se referir ao sorrisinho nos lábios depois de um orgasmo, "pushing me higher, higher to the castle in the air", pra explicar os momentos pré-orgasmos, causados pelo membro bem torneado e de tamanho considerável, o que não poderia ser diferente pra não estragar a fantasia ilusória das moçoilas virgens ou mulheres mal coitadas.
  • A tentativa forçada da autora para criar nomes, como, por exemplo, "Vanilla Sex", pro sexo papai e mamãe, ou "Red Room of Pain", pro covil sado-maso, que possam vir a ser usados por revistas femininas (acho que já estão sendo usados) aumentando as vendas do livro por curiosidade, 
  • A personagem principal, com 21 anos, no último ano de faculdade de Letras/Editoração, sei lá, com interesse pessoal em literatura inglesa,  nunca teve sonhos eróticos, se masturbou, namorou, transou ou tomou umas. A verdadeira falsa pudica, bonita de cair o queixo e levantar pinto, por quem todos os homens a sua volta se interessam, mas que não se sente atraída por nenhum deles, que, diga-se de passagem, são garotos normais, pobres, da idade dela.
  • Mas, então, ela entrevista  um empresário, que não poderia ter outra estória de vida pra que a trama se desenrolasse: filho adotado ainda pequeno, nos seus vinte e tantos anos já um milionário, sabe pilotar helicóptero e planador, mora em um apartamento que mais parece uma galeria de arte. Tem estilo, dinheiro pra mantê-lo, é lindo, elegante, musculoso, com um chauffeur a tiracolo. Maaaaassss, que por ter sofrido abuso e violência até os seus quatro anos de idade e por ter sido aos 15 seduzido pela amiga de sua mãe adotiva, que o introduziu ao mundo de dominação e submissão típico dos sado-masoquistas, nunca namorou e tem uma dificuldade de gozar se não for causando dor e  dominando as mulheres com quem ele faz um contrato pra definir os limites da coisa, porque ele é sádico mas também um gentleman, de fala mansa que nunca perde a compostura, nem a chance de ganhar dinheiro e ser altruísta e ainda investiu no negócio da pedófila que o levou pro mal caminho. Tá bom!
  • Aí, ela cai de quatro pelo cara (queria ver se fosse um rico feio ou um bonito pobre) e ele não perde a chance de cair matando em cima. Começam, então, as preliminares intermináveis até se chegar aos finalmentes que tanto as pessoas estão discutindo em fóruns, blogs e revistas. Gente! Pra mim, nada mais é do que narrativa repetitiva de uma maneira doentia diferente de se fazer sexo. Se alguém acha que alguma coisa ali pode vir a mudar o rumo de sua vida sexual, ótimo, mas é porque o  sexo tá bem capenga mesmo.
  • Ela nunca tinha tido um orgasmo, mas desde o primeiro encontro, ela é capaz de ter orgasmos múltiplos de todas as formas, em minutos. Nunca fingiu um sequer ou nunca brochou. Parabéns, minha filha!
  • Ah, ela é tímida, tadinha! "I blush scarlet", "I blush at the intrusive thought...", "I flush", "I take my blazing face out of the room...", "I can´t look at him.", "I bite my lips","I hide my face", "I look at my hands" e... e ela repete estas mesmas descrições over and over.
  • E over and over, ele a presenteia com bens caríssimos aos quais ela diz que não pode aceitar, mas que os aceitará a titulo de empréstimo.
  • A dita mantém muita conversa com sua consciência e com a "inner Goddess", numa linguagem meio Jane Austen que não tem nada a ver com a ideia original deturpada de sacanagem  romance erótico .
  • As descrições do Sr Grey são sempre as mesmas: "He is hot", "...his pants falling from his hips", "the smell", "He cocks his head to one side",  "How can he know?", "Oh, no, what´s he doing now?", "What the hell is he doing to me?", "He runs a hand though his hair...", "You completely beguile me. You weave some powerful magic", "How sexy he unwraps, produces a foil packet (camisinha) from his pants pockets". "He makes me so wanton". Sinceramente, essas expressões repetidas on and on, só me fazem perder o tesão de continuar lendo.  
  • Eu acho gozado que um livro que pretende ser erótico pra donas-de-casa mais parece pornografia para adolescentes virgens chegadas a uns  vampiros bem dotados. E eu acho foda não ter pensado nisso antes.
Alguém quer comprar a trilogia por dez paus mais correio?


21 comentários:

  1. taí gostei do teu comentário sobre esse livro, tb já tinha escutado falar, mas acho que é modismo e nao sou levada por modismos, espero q vc consiga vender esse traste de livro, aff e ainda é uma trilogia outro moda atual...

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  2. Respostas
    1. Hi, Jutta, did you manage to understand my post with the Google Translator? Super!

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  3. Ahahahahahah. Nessa "tentação" não caí eu. Se é par ler sexo duro nada como um bom Henry Miller :)

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  4. Você não é a primeira mulher que leio que achou o livro muito ruim. E dá toda a pinta de ser, mesmo, pelas expressões que você pinçou da "narrativa".

    De resto, acho melhor você mandar os livros para reciclagem. Se a gente pagar a postagem do Deutsche Post pra mandar pro Brasil, ficaremos todos no prejuízo! Hahahaha!

    Beijins de todos aqui.

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  5. Aliás, lembrando Renato Russo: "sexo verbal não faz meu estilo..."

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  6. Fiquei sabendo deste livro e que a critica detonou mesmo... até coloquei esses dias lá no blog...
    fiz uma listinha boa pra trazer agora do Brasil, pois aqui esta dificl de comprar livros em portugues...
    beijosssssss

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  7. Lelé, adorei sua review super convincente, na qual confio cegamente. Já não estava muito inclinada a ler essa modinha de marketeria... agora então, nem perco mais meu escasso tempo lendo outras críticas. Thanks for "unveiling the truth".Bjs

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    1. Aninha, querida, que bom ter voce por aqui. Ao menos, meus amigos que ainda não gastaram dinheiro comprando o livro, não vão correr o risco de.

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  8. Lelé, adorei a sua review. Super convincente. Eu já não estava muito inclinada a ler essa modinha marketeira... agora então, não perco meu precioso tempo lendo outras críticas. Bjinhusss

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  9. Esse livro ainda não virou moda por aqui não, na verdade só vi os comentários nos blogs amigos estrangeiros!
    Eu adorei a sua crítica! Vale a pena passar direto por esse livro, isso sim!!
    Obrigada pela dica!!
    Beijo!

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  10. Meu comentario nao tem a ver com o livro, mas...
    "Tá,tá, eu sei que não é bom ler sentado na privada pois causa varizes"
    sério isso? Eu passo hooooras lendo um livro na tranquilidade do banheiro. Tá, horas nao, mas um bom tempo. Eu chegava a fazer cocô de 40 minutos quando eu estava lendo o Senhor Dos Anéis.

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  11. haha então é isso? E na Thalia tem uma mesa quase inteira (se não for inteira mesmo) só com esse livro, não é? Ou eu vi errado?

    Se eu já não queria ler, agora eu nem preciso mais mesmo.hehe

    Adorei a crítica!

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  12. Otimo review. Obrigada por economizar esse tempo na minha vida. hahahah :)

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  13. Eu já não estava muito interessada no livro, mas todo mundo só fala nisso!!! Agora tenho certeza que não vou ler mesmo.... hehe bjs e thanks

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  14. Tem um though no lugar de through aí no texto que eu tô com pregui de corrigir, tá?

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